domingo, 18 de julho de 2010

AÇÕES AFRODESCENDENTES NO CENTENÁRIO DE ITABUNA


AÇÕES AFRODESCENDENTES NO CENTENÁRIO DE ITABUNA

Itabuna comemora o seu centenário de emancipação política. Marcada por uma diversidade cultural e étnica, a sociedade itabunense se mobiliza para os festejos. Várias molduras, no entanto, delimitam um quadro social, político e econômico em que diversos segmentos da população itabunense ainda se debatem por conquistar seus direitos e participação no cenário municipal. Entre tais segmentos, é notória a situação dos negros, seja na economia, na educação, na religião, na saúde, na moradia, no lazer. Tanto quanto nos demais aspectos, foi na religião que os afrodescentes de Itabuna encontraram uma muralha de preconceito descomunal. E justamente no campo da religião de matriz africana os afrodescentes fincaram trincheiras de resistência.
A princípio, tal segmento social foi considerado sob uma falsa suposição de um relacionamento afetuoso com as classes dominantes. Com a falência de tal entendimento, passou-se ao tempo da folclorização. Foi uma época em que as escolas e a sociedade como um todo consideravam os valores, símbolos e liturgia das religiões de matriz africana como motivos para diversão. E sob a aparência de eventos folclóricos, os afrodescendentes viram seus valores religiosos vilipendiados, tratados como algo exclusivamente motivador da diversão.
A virada de tal quadro vem acontecendo no bojo das mudanças nacionais, capitaneadas pelo movimento negro, pelas reformas educacionais, pelo restabelecimento do Estado de Direito, pela vivência da prática democrática. Em Itabuna, no entanto, o ritmo de tais mudanças é muito lento ainda. Por isso mesmo, urge que os afrodescentes se organizem para reivindicação de seus direitos constitucionais.
Acreditando nisso, um grupo itabunense de praticantes de religiões de matriz africana iniciou uma série de atividades, no sentido de conseguir organização social, a fim de fazer frente a tal estado de coisas. Tal grupo é constituído por babalorixás, ialorixás e pessoas graduadas de diversas entidades religiosas da referida matriz. A partir de reuniões quinzenais, que ocorrem em diferentes terreiros de candomblé e centros de umbanda, o referido grupo vem estruturando suas bases de ação. Desse trabalho, um resultado concreto se avulta no nível de atividades e de ações políticas.
Assim, foi fundada a Associação Grapiuna de Entidades Religiosas de Matriz Africana ̶ AGREMA, que objetiva congregar as Casas de culto que comunguem dos ideais da referida associação; foi identificado Oxalá como Orixá Padroeiro de Itabuna; decidiu-se pela participação nos festejos do centenário de Itabuna e pela realização do Projeto Terreirada, financiado pela Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade, em parceria com a Prefeitura Municipal de Itabuna, Universidade Estadual de Santa Cruz, Representação Nordeste do MinC, Associação Grapiúna de Entidades de Matriz Africana(com uma série de palestras, exposições e atividades artístico-culturais) e de um ritual religioso, integrado no calendário oficial da cidade, dos festejos do centenário.
Tais ações objetivam beneficiar o coletivo das Entidades Religiosas de Matriz Africana da Região Grapiuna. Com siso, busca-se fazer frente às trincheiras do preconceito, ainda tão fartas nesta Região. Compreende-se que, desse modo, se contempla a diversidade étnica e cultural, na defesa do exercício da cidadania para afrodescendentes, no respeito aos direitos humanos, no atendimento aos anseios de um considerável segmento da sociedade grapiuna.
De outra sorte, contribui-se para o rompimento de barreiras sociais, na construção do conhecimento, num sentido prático, sobre as raízes, a história e as linguagens religiosas dos afrodescendentes em Itabuna. Em Itabuna, a população de origem negra vive em um meio sócio-econômico desfavorável, carregando con sigo formas culturais relacionadas aos conflitos, à resistência, à rejeição, à superação e à exclusão, próprias do seu passado histórico e de suas vivências culturais. Seus valores, principalmente os religiosos, estão ocultos, são incompreendidos e não apresentam significado para a sociedade mais ampla. Tal trama contribui para que os afrodescendentes se distanciem progressivamente de suas referências culturais e históricas. Evidentemente, isso também concorre para a expropriação de saberes, dicotomias sociais e reforço de preconceitos.
As ações do referido grupo buscam a valorização da cultura e religiosidade afro-brasileiras. Objetivam o respeito e o diálogo com outras religiões, para a construção de um mundo em que haja maior entendimento entre as pessoas e sejam aplicados os paradigmas da Justiça e do Direito. Evidentemente, disso decorrerá maior entendimento entre as religiões de matriz africana e de demais religiões. Tudo isso há de concorrer para o fomento da reflexão crítica da história, da cultura e da realidade social afro-brasileira em Itabuna, na Região Sul da Bahia e no Brasil.
As ações também almejam mostrar a importância dos negros na cultura regional. Para tanto, há de se discutir a questão do racismo e sua influência na auto-estima do segmento social constituído por afrodescentes. Daí, um método de trabalho centrado na divulgação das origens, histórias e realizações do povo das Casas de Matriz Africana e no reconhecimento de seu valor na formação étnica e riqueza cultural de Itabuna. Por isso, investe-se na criação de um canal alternativo de divulgação da herança dessas Casas, para que haja a continuidade delas, através da herança cultural de seus antepassados a seus sucessores. Trata-se de investir na dissolução de um valor pernicioso encapsulado na afirmação de que somos um povo sem memória.
Assim, todas as Casas de culto de matriz africana e a população de Itabuna em geral estão convidadas para participar do Projeto Terreirada, que acontecerá nos dias 22 e 23 de julho, nos turnos matutinos e vespertinos, no Itabuna Esporte Clube. No encerramento do evento, acontecerá a celebração de um ritual em homenagem aos ancestrais e em louvor a Oxalá, considerado pelas Casas de Culto como Orixá Padroeiro de Itabuna. O evento ocorrerá na Avenida Beira Rio, no dia 23 de julho, às 18 horas.
De igual sorte, o convite continua em aberto a quantas entidades religiosas de matriz africana que queiram juntar-se ao grupo propositor na luta por alcançar os objetivos aqui defendidos.

Itabuna, 19 de julho de 2010.
(Assinam essa declaração um conjunto de onze entidades religiosas de matriz africana.)

Nome/Sacerdote Terreiro/Templo
01-Iyálorixá Desdêmona Ferreira Dantas Ilè Axé Oya Funké
02-Babalorixá Ruy Póvoas Ilè Axé Ijexá Orixá Olufòn
03-Babalorixá Jorge Eduardo Silva Santos Ilé Axé Ìjoba T’Osumare-Yewà
04-Mametu ti N’kissi Altina Pereira dos Santos Terreiro de Oxum
05-Babalorixá Genivaldo Guimarães dos Santos. Ilé Ifá Orunmila Elerin Ipin
06-Babalorixá Romário Pereira de Almeida Ilè Axé Omineji lona
07-Mametu Maria Lúcia Santos Conceição Ilè Axé Ela Boros si
08-Omorixá Maria Luisa Kruschewski Clímaco Ilè Axé Iyá Omin
09-Iyálorixá Sônia Maria da Silva Ilè Axé Águas de Oxum
10-Babalorixá Antônio Porqueres de Souza Ilè Axé de Oxossi
11-Babalorixá Paulo Ricardo Valette Nascimento Ilà Axé Ijobá Laadè
12-Omorixá Maria José Batista Terreiro de Xangô
13-Tatetu ti Nkissi Reginaldo dos Santos Terreiro Rei de Visaura
14- Babalorixá Aílton de Oliveira Silva Ilè Axé Ogun Talokãn
15- Tata Marinho Rodrigues Terreiro Matamba Tombenci Neto Ilhéus - BA

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